quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Sofia

laguna3

Foi numa noite como esta que ela chegou. Eu nada podia fazer naquele momento. A tempestade foi rápida e avassaladora. Lembro-me bem porque o meu corpo sentia este mesmo estremecimento ao ser sacudido pela brisa da manhã que estava por vir. Não dizia nada. Palavra nenhuma poderia dar um destino diferente àquela noite. Senti-me prisioneiro da minha alma, clandestino em meu corpo. Culpado e com nenhum esforço para obter a inocência, carreguei religiosamente meu sinistro fado.

A sombriedade dos dias que se seguiram foi-me remédio, comparada ao peso da dor que violava meu espírito. Fui o eterno doente a quem não interessa a cura. Deleitava-me em meus pesares. A cada angústia regozijava-me, como o pai se regozija ao receber em casa o filho outrora perdido. Não questionei o destino de meu espírito; minha alma se esparcia, então, na densa escuridão em que vivia. Onde habita, oculta, a luz.

Dói-me sua agressão; lastima-me seu toque. Carrego no espírito as incuráveis chagas que ela me trouxe, na alma, o ardente desejo de possui-la e no corpo, as inegáveis evidências do meu pecado. Cigana, me ressuscitou da morte causada por ela mesma. E, por isso, aprisionou-me. Não há caminho de volta. Assim como a noite esconde o dia, seu mistério arrebatou meu ser.

Amo-a por isso odeio-a. Somos.

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